terça-feira, 20 de março de 2012

                                              Meu filhinho Paulo Vinicius
                          "Grande é a poesia, a bondade e as danças. Mas o melhor do mundo são as crianças." 
                                       Fernando Pessoa

Resenha do Livro “Educação Infantil e Registro de Práticas de Amanda Cristina Teagno Lopes

A autora, Amanda Cristina Teagno Lopes é pedagoga, atua como professora de Educação Infantil na prefeitura de São Paulo, o livro aqui resenhado é fruto de sua dissertação de mestrado apresentada a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e com muita clareza ela discorre sobre a importância do ato de registrar a prática pedagógica como forma de reflexão e construção da memória, da identidade e do conhecimento e para tanto, Lopes convida no primeiro capitulo vários autores para um diálogo, questionando: O que é registrar? Registrar para quê? E participam da conversa Madalena Freire, Paulo Freires, Cecília Warschauer,  Miguel Ángel Zabalsa e Júlia Oliveira-Formosinho.
Zabalsa concebe o professor como um prático produtor do conhecimento, considerando as diversidades de formas de registros diários.  Warschauer acredita que o registro favorece a reflexão, a construção da memória, da historia e da identidade. Na sequencia entram na roda de conversas as professoras portuguesas Júlia Oliveira-Formosinho e Ana Azevedo e elas nos falam que o registro nos possibilita a compreensão da realidade e com isto sua transformação. Madalena Freire situa o registro como instrumento metodológico e sua importância na socialização e publicação de experiências. Paulo Freire da sua contribuição na conversa, comentando que precisamos exercitar a capacidade de observar, registrando o que observamos, arriscando a fazer observações críticas e avaliativas sem, contudo marcar como certezas absolutas.
Lopes vai identificando a importância do registro como forma de construção de uma nova concepção de criança, de educação e de professor atuando como pesquisador, como autor de sua prática, a qual se faz e refaz a cada dia. Ao ampliar a concepção de registro, percebendo-o como expressão, identifica-se o “desenho” como forma privilegiada de linguagem, memória, reflexão, descrição e análise. A autora chega até a criança como produtora de registros e não apenas reprodutora de uma linguagem estereotipada e seus desenhos unem-se a construção de memória, de identidade e de aprendizagem.
No segundo capitulo, Lopes identifica o registro no contexto da Educacão Infantil como imprescindível ao trabalho do professor relacionando-o a observação, ao planejamento e a avaliação. A autora em seguida nos presenteia com o inicio da historia da Educação e da Educação Infantil em São Paulo, passando pelos Jesuítas, José de Anchieta, Rui Barbosa que já em 1822 defende a constituição do jardim de infância como propunha Froebel.  Mas só em 1875 surgem os primeiros jardins de infância brasileiros constituidos pela iniciativa privada e destinam-se a atender as crianças das classes mais abastadas, entre eles o Colégio Menezes Vieira no Rio de Janeiro, a Escola Americana e o Jardim de Infância Caetano de Campos em São Paulo e em 1889 no Rio de Janeiro é inaugurada a primeira creche para filhos dos operários que se tem registro, da Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado.
E como ocorria naquela as formas de registro pelos professores? Em 1896 surge a “Revista da Infância” do Colégio Caetano de Campos destinada a ser um modelo a ser seguido por outras instituições, e eram as próprias professoras do Caetano de Campos que escreviam os artigos e estes eram de caráter prescritivo, indicando receitas a ser seguidas pelas outras professoras. Vamos passeando pela história, pelos anos 20, marcados pelo movimento operário e a luta por melhores condições de trabalho e por locais de guarda e atendimento de crianças de mães trabalhadoras. Nos anos 30, cresce a reivindicação por um serviço de assistência a infância que envolva educação e a saúde. Em 1935 é construído os primeiros Parques de Infantis nos bairros de grande concentração operaria que vão cumprindo seu papel social conforme o entendimento de infância da época. E em 1975 os parques passam a serem denominados Escolas Municipais de Educação Infantil.
Mas e o registro no contexto apresentado, os professores registravam, o quê, para quê? Eis as perguntas novamente lançada por Lopes e identifica-se poucos registros de práticas por professores da Educação Infantil, os registros das praticas não eram valorizados como instrumento essencial a ação docente e a inexistência desses registros era porque não se pensava no professor como um ser reflexivo e na complexidade da prática. Lopes pesquisa mais centralizadamente as publicações da Revista Jardim de Infância e nos Boletins Internos da Divisão de Educação e Assistência e Recreio e constata de alguns pequenos relatórios produzidos pelas professoras Joanna Grassi, Anna de Barros e Izabel Prado que eram programas traduzidos de jardins de infância estrangeiros. Mas e os parques infantis? Os registros das práticas são poucos e quando produziam alguma forma de registro de por meio de relatórios obrigatórios que se não fossem entregues não receberiam o salário. Nota-se que em todo o segundo capítulo que a voz dos professores é muito fraca no período estudado pela autora, mas que de certa forma recupera a importância da narrativa para a construção da história.
No terceiro capítulo, a autora recupera seus registros de prática e textos que fundamentam sua trajetória profissional e procura responder: O que dizem os materiais? Em que medida contribuíram para o meu processo de desenvolvimento profissional e de melhorias de prática?
Os cadernos de registro, portfólios produzidos pela autora no ano de 2003 em uma Escola Municipal de Educação Infantil, de inicio não tinha leitores para os registros, já que Lopes produzia por considerar de sua importância para seu trabalho como professora. E continua ao abordar que as possibilidades e as limitações do registro da prática dependem, em grande parte, do modo pelo qual esse registro é utilizado/valorizado/reconhecido no contexto. A autora passa a analisar os materiais primeiramente os cadernos de registro e conclui que possibilitaram momentos de reflexão sistemática sobre o trabalho, percepção de faltas e elaboração de encaminhamentos e não como apenas narração de fatos. Ao passar para os portfólios produzidos nos anos de 2000 a 2003, conclui que a narração e reflexão fazem-se presentes e as crianças aparecem como protagonistas da ação juntamente com a professora e sua voz manifesta nos relatos. Finalizando o capítulo Lopes evidencia que o registro da prática passa por todos os momentos da prática: do planejamento a avaliação, a sistematização de experiências e a divulgação dos trabalhos aos pais ou a outros professores.
No quarto capítulo, as considerações finais, a autora conclui que é suma importância o registro das práticas como elemento para o trabalho docente, para o desenvolvimento profissional e para a melhoria da qualidade de ensino, e espera que as suas reflexões frutifiquem práticas reais, concretas e contextualizadas de registro que se tornem significativas para os envolvidos e promovam efetivamente a melhoria da ação.
O livro é uma grande contribuição a todos os professores no desenvolvimento de registros. No contexto do livro, o registro é considerado instrumento para as práticas reflexivas do professor, e são coletados do dia-a-dia, ou seja, dos fatos escolares. O registro, como mediador entre a prática e a teoria, é imprescindível na reflexão sobre o trabalho pedagógico; entretanto, a realidade objetiva não pode ser desconsiderada. 
Diante do que propõe a autora e das evidencias deste estudo, o registro das diferentes ações e relações que envolvem o cotidiano de uma instituição de Educação Infantil devem ser guiados pelas inquietações que emergem das ações pedagógicas, sobretudo, objetivar a permanente atenção às manifestações infantis diante das proposições dos professores. Assim, Lopes conclui que esse recurso, quando refletido à luz da teoria e no compartilhamento com o outro, favorece a tomada de consciência da prática pedagógica e, consequentemente, o planejamento de todas as ações que envolvem o cuidado e a educação das crianças pequenas nas instituições educativas. 

Rúbia Quintiliano Matoso, pós graduanda do Curso Educação Infantil e Suas Linguagens. Oferecido pela Prefeitura Municipal de Campo Grande – MS em parceria com Instituto de Ensino Superior da FUNLEC – IESF.